sexta-feira, 28 de maio de 2010

sobre Ele.




'Deus, existe. Mas é distraído. E além de existir e ser distraído ainda se dá ao direito de caminhar nas nuvens, o que sabemos, causa danos irreversíveis. Como na questão dos que escorregam. Ele vê, mas pouco ou nada faz porque desconfia e em seguida acredita que trocar as pernas, as ideias e os caminhos é apenas um passo mais doido de um balé estranho, do qual ele pode até achar feio, mas só isso. Afinal, o livre arbítrio foi oferecido e de bom grado aceito pelos primeiros. Depois do que você leu até aqui, pode não parecer, mas Deus gosta mesmo é de escutar as orações. Principalmente dos que batem palmas. Acha-os interessantes, tão desengonçados e maiores que a própria casca a ponto de precisar romper batendo uma extremidade contra a outra, de tanto que tem dentro. Não se engane, Deus usa o olhar amoroso com parcimônia e desconfiança. Acha bonito mesmo é a espada que desembainha rápido, num puxão de afiadas estrelas semi-nuas. Diz pouco, fala menos ainda. Os que ao acaso o escutam abrem logo igrejas, toldos coloridos sob sóis e chuvas, mal sabendo que aquilo foi só sua voz em falsete cantarolando alguma música sem nexo. Deus não gosta de fazer sentido, sabe? Por isso o ornitorrinco e a rã. Quando descobriram o avião, ele riu de escorrer lágrimas. Nunca foi preciso ter asas para encontrar o céu. Quem não vive as ilusões sem retornos pode nem imaginar, mas ele cospe em cima. Detesta gente sem conexão alguma com o irreal. Manda sol quando alguém muito sangra e chuva para estancar tremores. Porque é preciso que o coração, único órgão vesgo e de vontade própria, caiba em nós. Deus sobe no ônibus e encosta o corpo nas mulheres. Mesmo as feias. Melhor que fazer de novo, ele pensa bebendo vinho que o filho ensinou a multiplicar. Hoje, quando conversamos me garantiu que as coisas vão dar certo. Já sei que o melhor é desacreditar. É que além de tudo, neste inverno Deus está usando esporas no sapato. De doido assim, melhor desconfiar.'

Cristiane Lisbôa



Sabia que conhecia esse Cara de algum lugar...

Ps: porque é o humor que nos salva da absurdez dos dias, certo, fedozera? Concordo com você. Você era prática, eu era teoria. Agora tô sendo prática. Tentando. Conseguindo... eterno gerúndio esse, viu! Um dia de cada vez.

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